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Amazônia e eleições

por | 30/05/2022 | Amazônia, Governança

Artigo publicado originalmente em O Estado de S.Paulo, em 28/05/2022

Por Izabella Teixeira, Roberto Waack, Renata Piazzon e Lívia Pagotto*

Neste ano, quando o Brasil reafirma seu compromisso democrático, a iniciativa Uma Concertação pela Amazônia definiu uma missão: construir, ao longo do ano, com toda a sua rede de organizações e de iniciativas parceiras, propostas de desenvolvimento sustentável para a região amazônica que possam ser adotadas nos primeiros cem dias de governo pelo Executivo federal, o subnacional e pelo Congresso Nacional.

Criada em 2020, a Concertação pela Amazônia reúne atores dos mais diversos setores – público, privado, academia, imprensa e sociedade civil – na busca de alternativas para a região. Para a rede, pensar a Amazônia vai além de resolver questões locais, mas é a possibilidade de criar um caminho de desenvolvimento para o Brasil e, também, para o mundo.

Hoje, o necessário e urgente combate ao desmatamento é protagonista do debate, mas não pode encerrar uma abordagem para a Amazônia. Não dá para falar de desmatamento sem falar de desenvolvimento. E isso significa ter um olhar sistêmico para o território, capaz de conectar as diferentes agendas sociais e ambientais relevantes para a população local. Para combater o desmatamento, portanto, é preciso pensar em ações estruturantes nos campos da educação, da saúde, da economia, da cultura, da segurança pública, da infraestrutura, da ciência e tecnologia e de cidades.

A experiência brasileira já provou que é possível reduzir o desmatamento com ações de comando e controle. Mas ainda permanece o desafio de como transformar mentalidades e criar as condições para que os brasileiros, principalmente as populações que vivem nas áreas de floresta, conciliem o capital natural, qualidade de vida e prosperidade econômica.

Por isso a conexão entre desmatamento e educação, por exemplo, faz tanto sentido. Somente incorporando as peculiaridades culturais da região e o valor da natureza em sua estrutura é que o ensino será capaz de gerar oportunidades de desenvolvimento humano e de condições de vida que sejam mais atrativas, quando comparadas a atividades prejudiciais ao meio ambiente ou mesmo a atividades ilegais.

Na mesma linha, não há como dissociar o desmatamento da necessidade de criar mecanismos para o estabelecimento de uma economia voltada para a conservação. Se não houver opções econômicas para substituir o desmate, ele vai se apresentar como alternativa mais vantajosa no curto prazo. Daí a importância de pensar soluções como uma política fiscal, uma política de crédito para fomentar uma economia sustentável que inclua a floresta em pé.

A conectividade no território também ilustra com clareza como um elemento, o acesso à internet, por exemplo, está relacionado a múltiplas dimensões ligadas às oportunidades de desenvolvimento na Amazônia. No combate ao desmatamento, a conectividade ajuda a criar uma dinâmica de monitoramento comunitária. E também é crucial para dar suporte ao processo de educação, para acompanhar os dados da saúde ou para permitir que as pessoas possam criar condições de trabalho na Amazônia. Assim, abordar a conectividade é acionar a dimensão de comando e controle, a de progresso e a de bem-estar das pessoas.

Novo paradigma. Olhar a Amazônia por essa abordagem sistêmica exige um modelo disruptivo de desenvolvimento que concilie diferentes perspectivas sobre uma agenda comum para a região.

A construção desse paradigma depende de espaços de troca, de diálogo, da convivência de vários interesses, da convergência e, principalmente, do reconhecimento do valor da diversidade.

A Amazônia é um convite para criar um novo paradigma de desenvolvimento para o País, baseado na relação com o capital natural, mas com um forte componente social (a exemplo de soluções de desenvolvimento que acelerem a erradicação da pobreza e da fome na região). O que muita gente enxerga como uma imensa mancha verde no mapa brasileiro abriga quase 30 milhões de habitantes e, portanto, sonhos, expectativas e histórias de vida.

Esse novo paradigma demanda, ainda, um rearranjo do ambiente institucional, um olhar inaugural sobre as responsabilidades nos diversos níveis de governança – municípios, Estados e Federação. A definição dessas novas regras passa, inclusive, pela conexão do Brasil com o resto do mundo. A comunidade internacional tem interesse em saber como conectar o capital natural com o desenvolvimento, a justiça social e o bem-estar e como avançar nesse modelo.

Justamente por ser o país da Amazônia – ou, melhor, das Amazônias –, o Brasil talvez seja um dos poucos com potencial de fundar esta nova relação entre pessoas e a natureza com a vitalidade e a dimensão necessárias. Amazônia é solução!

* Respectivamente, ex-ministra do Meio Ambiente e fellow do Instituto Arapyaú; presidente do Conselho do Instituto Arapyaú e cofundador da Uma Concertação pela Amazônia; diretora do Instituto Arapyaú e secretária-executiva da Uma Concertação pela Amazônia; e gerente de Conhecimento do Instituto Arapyaú e para a rede Uma Concertação pela Amazônia

[Foto: Raimundo Teixeira estevesbae/Pixabay]

 

ROBERTO S. WAACK

É membro dos conselhos da Marfrig, Wise Plásticos, WWF Brasil, Instituto Ethos, Instituto Ipê e Instituto Arapyaú e visiting fellow do Hoffman Center da Chatham House (Londres). Tem uma longa carreira como executivo e como empreendedor, tendo atuado em empresas nas áreas farmacêutica, de biotecnologia e florestas. Foi CEO da Fundação Renova, entidade responsável pela reparação do desastre de Mariana (MG), co-fundador e CEO da Amata S.A. e CEO da Orsa Florestal, além de diretor da Boehringer Ingelheim e Vallée. S.A. É cofundador da Coalizão Brasil Clima, Florestas e Agricultura. Atuação profissional com concentração em governança, planejamento e gestão estratégica, gestão tecnológica&inovação e sustentabilidade. Formado em biologia e mestre em administração de empresas pela USP.

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